20 de out. de 2009

SALVE GERAL! – O Dia que São Paulo Parou

Quinze segundos e minha vida mudou”... Para sempre.

Se Salve Geral merecia ou não ir à disputa do Oscar não consigo realmente avaliar. Mas que a dose de suspense que ele oferece é digna de prêmio é fato.

Estive em alguns debates onde alguns diziam que o filme promove um endeusamento da criminalidade. Que não deveria concorrer ao Oscar por denegrir a imagem do país. Que é mais um filme sobre violência e polícia corrupta... Bem, pelas possibilidades que temos de trazer para Brasil a estatueta, penso que este filme é tão bom para isso como qualquer outro e eu não sou uma pessoa pessimista.

salve-geral_01Alguns comentam que fazemos filmes sobre miséria, pobreza e crimes e que lá vamos nós com um de já vu. Eu não tenho memória estatisticamente cinéfila que me permita dizer quantos filmes estadunidenses já assisti sobre Primeira e Segunda Guerras, Vietnam, judeus como coitados, Independência americana, ocupação do Oeste e assassinos em série. Não vejo porque o sangue americano jorrado ser mais cinematográfico que o latino, nordestino, brasileiro. Violência social não se esconde, se resolve. Se há vergonha de parte dos brasileiros dessa realidade de violência e corrupção ser vista, ela deveria ser revista aqui, deveria existir uma vergonha tão contundente que nos levasse não a esconder da visita a nossa louça lascada, mas ir às vias de fato para se ter algo melhor se não para apresentar ao mundo, para se viver no dia-a-dia.

Salve Geral tem o mérito de ter ótimas interpretações de atores em todo ou em parte desconhecidos (achei exagerado, caricato o personagem Pedrão, Guilherme Sant’Anna), um dos protagonistas que me lembrou muito Gael Garcia Bernal, não pela beleza mas pelo corte de cabelo e aquele ar entre o displicente e despojado. Tem um roteiro caprichado, bem amarrado e uma vez assistido sem os pré-conceitos por ser um filme nacional, é capaz de levar à reflexão sobre coisas que vão muito além do que a divisão maniqueísta entre mocinho e bandido, e que não há salvação para o cidadão incluído no sistema prisional vigente.

O que confere ao filme um tom documental é alem das inserções de imagens reais de conflito, o perfil das personagens, a direção não engana: o tempo todo em todo o filme vemos que ali não há santos nem heróis, há pessoas que chegam ao limite do certo e errado, entre o legal e o ilegal. Não há como evitar a sensação de que a qualquer momento algo de muito pior pode acontecer aqueles que por identificação, nos parecem terem ainda salvação...

Há pessoas que não nasceram para o crime, mas aprendem a se movimentar dentro de uma engrenagem criminosa, há pessoas que tem tudo para não delinqüir mas não saberiam viver sem uma mancha de sangue ou de qualquer outra sujeira nas mãos.

salve-geralLúcia (Andréa Beltrão) é uma professora de piano que ao ficar viúva perde prestígio e posição social indo morar num subúrbio distante. Ela tem um filho Rafael (Lee Thalor) que como todo bom adolescente não absorve bem a nova realidade. Rafael sai com um amigo mecânico num carro tomado emprestado sem permissão da oficina onde este trabalha, por capricho do destino no porta-luvas tem uma arma, por aquelas coisas que embora possamos ter feito um dia, jamais saberemos explicar, eles vão para um racha. É este jogo de vários erros que colocará Rafael em contato com os 15 segundos que mudarão sua vida para sempre, conforme ele mesmo diz e esta mesma combinação levará sua mãe a um mundo onde mesmo visto em filmes não podemos crer. Nas visitas ao filho ela conhece “Ruiva” (Denise Weinberg) advogada de um líder de uma facção criminosa, Bruno Perillo (Professor) que a usará para serviços ilegais. Lúcia entra num caminho sem volta e acabará por se envolver numa luta pelo poder da facção que ocasionará a paralisação de parte do país num dia de terror e pânico orquestrados pelo “partido” em represália às transferências dos presos, lideres da facção.

“Salve” na gíria dos bandidos de São Paulo é “recado”.

Salve Geral é um filme “de ficção baseado em fatos reais” onde nada, nem ninguém é o que parece ser na primeira vez em que aparece na tela.

Podemos refletir que se algumas autoridades simplesmente fizessem seu trabalho em vez de brincar de mostrar para a mídia que trabalham, teríamos menos problemas, muitas soluções, menos mortos, menos margem à corrupção e alguma fé de que as coisas pudessem dar certo. É a vaidade, até mais que a ambição que levam as personagens desse filme a uma miséria moral para a qual o dinheiro é apenas um pretexto.

Por:Rozzi Brasil. Ong Casa da Vida.

SALVE GERAL!. Brasil. 2009. Diretor e Roteirista: Sergio Rezende. Elenco: Andréa Beltrão, Denise Weinberg, Lee Thalor, Bruno Perillo, Guilherme Sant'Anna, Chris Couto, Eucir de Souza, Kiko Mascarenhas, Michel Gomes, Giulio Lopes, Taiguara Nazareth, Luciano Chirolli, Pascoal da Conceição, Julio Cesar (5), Otávio Martins. Gênero: Drama. Duração: 119 minutos.

2 comentários:

Kassya Mendonça disse...

Parabéns pelo belo texto.
Ainda não vi o filme, então não poso opnar sobre ele;mas vivo em São Paulo, e para nós estes dias de terror foram muito além do que a mídia mostrou; moro num bairro relativamente tranquilo e mesmo aqui houveram postos policias alvejados por bandidos, carros que foram atacados por granadas e pessoas que morreram simplesmente porque estavam no lugar errado na hora errada; os bandidos não tiveram dó; eles queriam intimidar ás autoridades e não mediram esforços para isto.
Estes dias vi no noticiario os acontencimentos do RJ; o que aqui aconteceu foi parecido, so que demorou mais de um dia.
Não deveriamos nos envergonhar da violencia que vivemos e assistimos, mas da falta de atitude perante a estes atos.
Mas quem sabe ainda temos salvação?
A Copa do Mundo e as Olimpiadas veem ai...

Beijos!

Rozzi Brasil disse...

Kayssa,
Feliz pela sua participação. Mais ianda por você ter gostado. Não entendi quando diz que durou mais de um dia... Aqui no Rio foi um dia só e já foi muito, olhando no mapa a área de conflito é insignficante em tamanho em relação ao tamanho à cidade. A
Absurdo porque é uma área densamente povoada dividida em bairros tradicionalmente suburbanos que abriga um povo pacato,sofrido, feliz, muito trabalhador, que se desloca horas pra chegar ao emprego.
A Vila Isabel é berço de Noel, local onde faço ações sociais devido o numero de comunidades.
Esta foi uma ação de um poder paralelo já acuado por algumas ações que estão diminuindo a área de liberdade para traficar. Uma mexida na estrutura de poder de ação, do tráfico no estilo, tem gente querendo uma fatia maior do bolo, que cresce à custa da miséria humana e da nossa falência social. Contudo eu acredito que isso colabore, sim para uma melhora para todos nós. Esses eventos esportivos não são do Rio, são do Brasil. A gente precisa sair da postura que escândalo na casa do vizinho significa que lidamos melhor com nossos problemas, não calar nunca foi solução. Concordo contigo que não devemos ter vergonha devemos agir, ainda que apenas mostrando nossa indignação!