13 de jan. de 2009

Nosso Mundo Ainda Cai

Se ela soubesse o que anda provocando por aqui, mais de 30 anos após sua morte, ficaria orgulhosa. Maysa virou, desde a segunda-feira passada, uma obsessão feminina. Sim, uma obsessão passageira, mas ainda assim absolutamente coerente com a personagem em questão e com o tipo de sentimento que ela mesma alimentava. Maysa era uma figura estranha, intensa, extremada, exagerada, única. Mas a impressão que se tem nesses dias de minissérie é que cada uma das espectadoras se identificou um pouquinho, um pouquinho mesmo que seja. Porque Maysa é a essência da trajetória da mulher contemporânea. Ou você não percebeu que, ali, nas entrelinhas, ela simboliza toda aquela nossa ladainha sobre as dificuldades de ser mulher, mãe, profissional etc etc.? Enquanto a maioria das mulheres ainda se conformava com o papel de rainha do lar, ela, desde cedo, chutou o balde como poucas e pagou caro como muitas.

A idéia não é endeusar a mãe de Jayme Monjardim, não. Se nem ele está fazendo isso, não serei eu a doida aqui. Maysa era, como parece ter dito Ronaldo Bôscoli, mimada mesmo. Era imatura, intransigente e auto-destrutiva e nada disso é digno de se louvar. Mas era uma apaixonada. E uma transgressora. Botou a cara a tapa para que nós, hoje, tenhamos, por exemplo, o direito de decidirmos nossa vida amorosa e sentimental sem interferências. Abriu mão de um casamento apaixonado e milionário para, mesmo que inconscientemente, provar que nossa independência era um caminho sem volta. Usou o talento e o sucesso para dar passos importantes para nós. Mostrou ao mundo o que é ter estilo.

O lado triste dessa história é perceber, a cada capítulo, que toda essa irreverência e transgressão vinham acompanhadas de imensa angústia e solidão. E mais triste do que notar que Maysa pagou com infelicidade, é saber que esse roteiro ainda se repete. E muito. Quantas de nós não sucumbimos à tristeza diante da incapacidade de se conciliar tudo o que desejamos e acreditamos que é preciso para ser feliz? Quantas de nós ainda caímos na armadilha de que é possível se realizar sem fazer concessões? Foi só Maysa ou faz tempo que a gente sofre por não conseguir abraçar o mundo? E quando a gente fica numa busca incessante de sei lá o quê?

Não sei, não, mas acho que a gente tem bastante a aprender na frente da TV esses dias. Nem que seja a lição de que marido milionário, com sobrenome e apaixonado, não é coisa que se dispense, e sogra chata a gente tem que aprender a lidar. Ou que cabelão, caftan (aquele vestidão tipo bata indiana) e olhos fortemente delineados são superfashion. Ou ainda que talento combina com sofrimento. E que homem, se lhe pareceu canalha uma vez, canalha será sempre. Ah, sim, e que mais perigoso do que dirigir bêbada é dirigir Brasília trocando fita-cassete. Ok, ok, foi só piada. Talvez a gente só precise se dar conta de que não vale a pena se levar tão a sério e que nossos sonhos são importantes, mas sonhar sozinho pode ser, de fato, muito solitário. Além de escolhas, a vida, sabemos bem, é feita de ajustes. E Maysa não soube - ou não quis - se ajustar.

Por Cláudia Cecília. jornal O Dia

2 comentários:

Kassya Mendonça disse...

Bom dia!
aprendi a gostar de Maysa, ainda criança, meu pai era fâ de suas músicas e dela. Acho q além de não querer se ajustar, a sociedade a cruficou por suas escolhas! Mas é bom ver na TV, algo q não endeuse um idolo que morreu, mas mostre a realidade, por isso o publico se identifica.
Bjuss!

Rozzi Brasil disse...

Oi, Kassya!
Verdade! Ela não deixou muito espaço para mitificação... A gente faz muitas bobagens ao longo da vida, mas para as mulheres essas bobagens pesam mais, para as mães os erros são redimensionados, mas o talento era tanto que sobrepujou tudo isso.

A trajetória de Maysa apresentada nesse trabalho e a reação de algumas pessoas me fez lembrar um outro ídolo da transgressão: Cazuza.
Ambos tinham tudo pra não sobressair acima da média burguesa de suas origens.Ambos transgrediram e se viam ora como o que eram idolos, ora como seres muito frágeis. Não eram santos, mas se tornaram deuses! Ambos deixaram uma arte incontestável.

Aprendi a gostar de Maysa ouvindo discos antigos perdidos na minha casa quando eu era adolescente, até hoje tenho uns 78 rotações dela. Tanta tristeza me comovia mas era a voz que me congelava